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Rafael Escobar
5 min readAug 2, 2019
foto da Giovana C.

(EDITH: eu tava no fim do mais ou menos longo processo de escrita desse pequeno texto que segue — normalmente levo dias pra escrever essas coisa que posto por aqui — quando hoje, há pouco, assisti o novo documentário “The Great Hack”, que ganhou o brasileiro nome “Privacidade Hackeada” e, adivinhem, TEM NO NETFLIQS, o qual, juntamente ao “Active Measures”, que também já mencionei em outros textos, dá uma baita explicada em alguns pontos que eu toquei nesse treco aqui. No Medium, além de infinitos outros lugares, tem também muito material de entrevistas com pessoas que trabalharam nas empresas referidas e outros tipos de análise das atuais conjunturas contemporâneas do nosso estranho presente tecnológico. Abraço.)

Fiquei de novo meio apavorado quando vi umas dez pessoas, uma do lado da outra, sentadas num murinho esperando o ônibus, e TODAS tavam com o celular na mão olhando pro negócio. Pensei que nenhuma ali devia tá conseguindo dar um descanso de qualquer tipo pro cérebro e que um treco que deveria ser algo ao nosso favor (internet em todos lugar) tinha se transformado numa pedra gigante presa no pé de todo mundo, um negócio que incapacita qualquer um de conseguir viver só dentro da cabeça por algum tempo, ou de tentar olhar um pouco mais adiante, além do que supostamente diz respeito a nós mesmos, de qualquer maneira. É realmente meio paradoxal: não conseguir ficar sozinho com a mente e não conseguir olhar pra coisas externas. Onde que vai parar essa consciência, então, é no microuniverso externo particular em que tamo ali como protagonistas, mas poucas, pouquíssimas, coisas são de fato sobre nós. Ou melhor, é tudo PRA nós, mas sem a gente; é coisa jogada na nossa cara sem dó nem piedade, que a gente fica ali recebendo e reagindo enquanto também proporciona isso pros outros (é bem possível, inclusive, que tu volta e meia pegue teu celular só pra conferir se não apareceu qualquer coisa na tela, sem nenhum grande motivo, como se tudo que acontecesse FORA dali fosse provavelmente menos interessante). É uma certa quantidade de músicas, uma certa quantidade de amigos, de familiares, de pessoas distantes, de páginas de memes, de notícias, grupos de discussão de qualquer coisa, enfim, a lista até vai aumentando, mas é mínima se for comparar, primeiro, com o que existe na internet; segundo, com o que existe em potencial dentro da nossa própria cabeça; e, por fim, com o que existe só no pequeno redor ali enquanto tamo esperando o ônibus. Até que fica poético, fica cafona, tosco, papo furado de “observar as coisas em volta”, mas não sei se é tão tosco assim. Parece que as coisas não têm mais o momento só delas, é tudo interrompido por um monte de intrusões totalmente desnecessárias que vão desde o que um amigo falou há pouco sobre o relacionamento DELE, até o aviso de que no dia seguinte vai ter um evento que tu vai ter que ir e ficar sorrindo, mas que no fundo tu preferia ir lá pra tacar uma bomba (essas coisas aumentam um pouco o stress, eu vi num aplicativo de meditação). Além disso, é óbvio que é muito estranho que a internet tenha se tornado uma “coisa” que proporcione que a gente use, antes de tudo, o Instagram, o Facebook e o WhatsApp, e depois desses mais alguns possíveis sites ou outros aplicativos, quando a internet é na verdade A INTERNET, aquele treco muito louco em que tá TUDO (que tu pode digitar ali e procurar e encontrar, basta querer, acredite nos seus sonhos, foco, força, fé). Eu sou bisbilhoteiro de celular em ônibus, não tô nem aí, e pode ser que tu já faça isso também, mas se tu não faz, tenta na próxima: entra no ônibus, deixa a ética de lado, só um pouquinho, e fica reparando na variedade enorme de gente que tá ali com o celular na mão, depois dá aquela boa verificada no que elas tão fazendo naquele aparelho. É óbvio, tu sabe, é Instagram, Facebook ou WhatsApp, ou os três ao mesmo tempo. Hoje, porém, eu fiquei de pé no bus do lado de uma moça que tava assistindo alguma série com fone de ouvido; acho que eu nunca tinha visto tão de perto isso antes e fiquei assistindo ali junto com ela (sem ela saber, claro, sou um voyeur de bus experiente), mas comecei a ficar puto da cara quando, já envolvido com a trama da série, curioso, tive que lidar com a moça abrindo o WhatsApp de minuto em minuto pra falar coisas como “acabei de passar do lado da casa do roger kkkk”. Assim não dá. Nem as propaganda na tevê interrompem o lance tanto quanto o próprio espectador contemporâneo. Enfim, Instagram, Facebook, WhatsApp, tudo nossos chefe, nos encaminhando pra Ansiedade, Stress, Desatenção, e é sempre bom lembrar que a constante função MULTI-TAREFAS muitas vezes nos leva a executar as múltiplas tarefas com o nosso cérebro humano transmutado no cérebro de uma GALINHA (inclusive andei vendo de novo por vários lados o tópico da qualidade do trabalho e da quantidade de trabalho, etc.), daí no final tu fez um monte de coisa que saiu tudo uma bosta. Não sei se eu gostaria de entrar também no tópico distópico (esse pode ser o nome do próximo ep visual da tua banda de new tropicália maluquets synth pop mpb) da gigantesca influência, senão “quase total responsabilidade”, desses três aplicativos nas trágicas eleições dos últimos anos em dezenas de países, mas esses tempos cheguei a imaginar livros de história de 2085 mostrando o período em que a maior parte do mundo foi governada pelo IFW (Instagram — Facebook — WhatsApp), usando termos como “a virada IFW”, etc. É claro que me senti um pouco estúpido pensando isso, porque hoje em dia não consigo mais ser rabugento sobre esse assunto sem me sentir um pouquinho culpado, tendo que sempre fazer um raciocínio posterior de “tá, mas peraí, quais são os reais problemas envolvendo isso e quais não são?”, até chegar à conclusão de que sim, é claro que existem muitas coisas de fato criticáveis nessa atual realidade, e outras que são bem mais apenas o meu espírito amargo agindo sobre a minha mente azeda. Mas não consigo mais, sinceramente. Quando entro nesses assuntos, surge com força o pequeno terraplanista que existe dentro de mim, e a minha vontade é de sair gritando que ainda seremos total e absolutamente reféns do controle tecnológico. Ali estava eu esperando o ônibus quando vi quase uma dezena de pessoas enfileiradas no muro interagindo com os seus celulares. Eu tava ouvindo música e fumando um cigarro, muito ansioso, como em todos os momentos, e fiquei chocado, de novo, mais uma vez apavorado e invadido pelos pensamentos mais apocalípticos; senti que eu precisava gritar alguma coisa ou pelo menos mostrar aquilo pra alguém. Foi no exato momento em que eu puxei meu celular do bolso pra tirar uma foto daquelas pessoas e mandar pra um amigo, que a minha alma se descolou do meu corpo, minha mente deu uma cambalhota e eu percebi que eu tava dentro de um paradoxo.

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